por João Marciano
Goodnight Mommy (Ich seh, Ich seh, no idioma original) é um filme austríaco que tem sido bem recebido por diversos festivais ao redor do globo. O suspense dirigido Serevin Fiala e Veronika Franz trabalha com menos de cinco personagens e uma tensão crescente na base de suspeitas sem provas. Na trama, Elias e Lukas são dois irmãos gêmeos de nove anos que vivem numa casa afastada. Quando sua mãe retorna após passar por uma cirurgia plástica ainda com as bandagens e curativos cobrindo-lhe a face, os garotos passam a suspeitar, após alguns tratamentos frios da mulher, que a mesma não é quem diz ser. Enredo simples que obriga o espectador a prestar maior atenção nos detalhes que indicam o desfecho do mistério, todavia, mesmo diante de tantos elogios, Goodnight Mommy não apresenta real originalidade. Sua estrutura imita O Mistério das duas irmãs, que por sua vez é uma refilmagem norte-americana do sul-coreano Medo (2003), o que o torna bastante previsível para quem possuí estes títulos no repertório.
A fotografia, por outro lado, é impressionante. Explorando uma iluminação pautada na claridade fria, pouca movimentação de câmera e enquadramentos de uma simetria quase kubrikiana, a rigidez da imagem é montada para provocar uma sutil opressão que ao longo do filme passa a provocar igual desconforto. Tal conceito perdura até instantes antes do desfecho, momento das revelações onde toda a ordem preestabelecida é enfim confrontada nos limites. O fundo psicológico é bem construído e garante tanto a solidez do roteiro como uma pequena diversidade de interpretações dos eventos; em contraste, nos deparamos com duas ou três cenas que não fornecem nenhuma contribuição para a trama, mas cujo valor estético as tornam aceitáveis. Como muitas vezes é esperado do cinema europeu, o ritmo mais lento somado a um enredo com alguma profundidade e um trabalho fotográfico que encanta quadro a quadro. As locações são de uma beleza e de um vazio surpreendente, captando e reforçando o sentimento de isolamento e solidão que ronda os personagens e os empurra para um conflito agressivo.
O elenco se apresenta bem afinado. A preparação dos dois atores mirins é bem competente, pois a seriedade e a forma como transmitem sem extravagância a psique de seus personagens é convincente o suficiente para que conquistem uma posição humilde num possível ranking de “crianças mais perturbadoras do cinema”. Não é incomum neste gênero que uma figura infantil assuma uma postura de resposta ou ameaça à altura de seu “adversário” (inclusive no quesito sadismo), mas não é sempre que tal personagem seja bem representado ao ponto de atingir a proposta. Goodnight Mommy, resumindo em poucas palavras, é um caso pouco recorrente de um filme com elevada qualidade técnico-artística que apenas perde por não dominar o suficiente o gênero cinematográfico que se propõe a ser. Mesmo com várias cenas fortes e de elevada tensão, falha ao prolongar demasiadamente o tempo de suspensão que o suspense necessita.