SEGUNDO DIA – MOSTRA COMPETITIVA
Por Denise Cláudio
No dia 07 de setembro, na sessão das 17h, o segundo dia da mostra competitiva da oitava edição do Cachoeira doc., o Cine Theatro Cachoeirano – tão lotado que algumas pessoas tiveram que se acomodar no chão – recebeu o curta Filme de rua e o longa-metragem Baronesa. Ambos os filmes se passam em Belo Horizonte, Minas Gerais, e retratam a realidade de grupos que resistem seja na rua ou na periferia da cidade. E mesmo com a proximidade geográfica e a resistência como temática comum, o modo como os diretores escolhem nos mostrar essas histórias é muito diferente.
Filme de rua, primeiro a ser exibido, é quase todo gravado por adolescentes que, com uma câmera, mostram suas perambulações pelas ruas de BH. Tudo é filmado de maneira a fazer os espectadores se sentirem parte do rolê, em meio a conversas sobre criminalidade, duras policiais, sexualidade, e sobre fazer filmes.
A consciência dos meninos sobre o mundo é evidenciada por suas falas, especialmente em dois momentos: o primeiro é logo no começo, quando um deles diz “todo mundo é gente, ninguém é melhor que ninguém não”, o que me lembrou de uma música onde Criolo canta “todo maloqueiro tem um saber empírico”. E o segundo momento, uma música composta e cantada por Samuel, que os presentes na sessão tiveram o prazer de ouvir pessoalmente também, que conta a história dele e de seu amigo conhecido por Diabo Loiro, que vivia em situação de rua e acabou falecendo.
Baronesa por sua vez é uma obra híbrida de documentário e ficção, obra realizada por uma diretora e tendo como personagens principais mulheres da comunidade, não atrizes, que interpretam situações vivenciadas por elas ou simplesmente concebidas em um processo de criação coletiva, mostrando a realidade dos moradores de periferia, o envolvimento das personagens nos ciclos de violência gerados pela guerra do tráfico e pela misoginia.
O modo como as relações se estabelecem entre Andreia, Leidiane e Negão, três pessoas que compartilham até uma caixa d’agua – que é utilizada como banheira –. faz com que o filme não seja uma mera vitrine para se mostrar a pobreza e recaia em um panorama superficial e sem propósito a periferia. Baronesa sabe seus motivos para existir, e existe tratando de uma realidade brutal de forma extremamente delicada, e ainda assim vemos a brutalidade da vida real, surpreendidos pelos barulhos de tiro, o susto da câmera que corre para dentro da casa acompanhando o dia-a-dia de uma violência naturalizada.
Juliana Antunes, diretora de Baronesa, narrou um pouco do processo da feitura do filme, de como os bairros de BH, ao todo são mais de 36 bairros de periferia com nomes femininos, inspirou o título e a temática da obra. A proposta inicial, de registar as moradoras desses locais a partir dos salões de beleza, acabou se transformando a partir da urgência de questões mais prementes. Tratando os aspectos da vida das personagens, mulheres que geralmente contam com pouca assistência e tem que se preocupar com a administração do dinheiro para sustentar a família e com a guerra que presenciam no bairro onde moram, Baronesa fez com que a equipe pudesse provar através de diferentes planos, cenas e etc., de uma fotografia muito bem aproveitada, a intensidade do feminino em suas muitas vertentes e complexidades.