Por Jhefferson Jheksom
Entre os dias 06 a 09 de Março ocorreu em Cachoeira, 120 km de Salvador, a Mostra Perfomance negra no Cinema Brasileiro.
Organizado pelo Cineclube Mario Gusmão, o evento audiovisual contou com um apanhado de filmes realizados entre o fim dos anos 50 e o começo dos anos 2000. As atividades ocorreram no Cineteatro cachoeirano com entrada gratuita e livre para toda comunidade.
Artistas e intelectuais negros foram contemplados durante o evento, dentre eles Grande Otelo, Léa Garcia, Mário Gusmão, Ruth de Souza, Zezé Motta e Zózimo Bulbul.
A revista Cinecahoeira esteve na mostra apreciando e acompanhando toda a programação, que foi aberta com a apresentação do monólogo “Contos da Africa”, do artista Antonio Carlos Osvaldo, “Badinho”, do Nucleo de Estudos e Pesquisas Teatrais do Recôncavo da Bahia (Nuclearte). A peça conta histórias vividas nos terreiros de candomblé de Cachoeira-BA, na época em que o poder público proibia os atos religiosos.
Após apresentação teatral, seguiu-se a exibição do filme “O Menino e o Velho”, do diretor Miguel Silveira, que estava presente na mostra.
O evento contou com a presença do Professor Jorge Cardoso, Diretor do Centro de Artes Humanidades e Letras, além da presença de Renata Dias, Diretora da Funceb. Encerrou com o cineteatro lotado para prestigiar a cantora e compositora Luedji Luna.
Nossa equipe bateu um papo com Fabio Rodrigues Filho, curador da mostra:
Como foi elaborado a curadoria tendo em vista na contemporaneidade novos métodos de abordagem e questionamentos da inserção da comunidade negra no cinema ?
A curadoria foi composta por 5 pessoas mais a equipe da mostra, projeto totalmente coordenado por estudantes. Criamos uma trajetória que não só discute a representação como também a representatividade. Encerramos a mostra com Viviane Ferreira exibindo seu curta “Um dia com Jerusa” que vai virar um longa e também o filme de Joel Zito Araujo “Filhas do Vento”. Foi uma curadoria para pensar o ator e a atriz negra no cinema brasileiro, pensar a agência desse ator, como ele se movimenta e subverte os papéis estereotipados em determinados períodos da cinematografia brasileiro, do fim dos anos 50 até os anos 80. Como esses atores precipitam a forma do filme, rompendo com a estrutura racista e seletiva de produção fílmica.
Qual o principal elo entre Rio Zona Norte e O Menino e Velho, que abriram o festival ?
Iniciamos a divulgação da mostra em 20 de Janeiro, aniversario de Mario Gusmão, no entanto, o pensamento e discussão dos filmes já vinham de antes. O Mario Gusmão é uma inspiração pra gente pensar a curadoria: ele é da dança, do teatro, do cinema, das artes, do corpo… A trajetória do Mario nos inspirava para fazer essa curadoria. Pensar como a trajetória desses atores compartilham pontos em comum, passando por experiências muito parecidas em termos de enfrentamento das estruturas racistas de produção fílmica, com estratégias de resistência que se parecem por furar o bloqueio e rasgar a imagem ou produzir uma contraimagem. Grande Otelo, em Rio Zona Norte é também essa força que está para além do filme.
Rio Zona Norte traz o samba, elemento significativo para o povo do recôncavo. O que mais foi possível destacar através do audiovisual na mostra ?
Durante a mostra fizemos um esforço para trazer pessoas de Cachoeira-BA não só pra ver os filmes, mas também para se apresentar durante o processo da mostra. A mostra foi a partir de uma representação social e racial que, inclusive, oprime esses corpos. A imagem torna-se um espaço cênico de disputa, construção de contraimagem e contranarrativas.
Quais desafios foram enfrentados para a realização deste projeto em Cachoeira-BA?
O cineclube é atualmente um projeto coordenado por estudantes. Temos muitos desafios institucionais que tornam a realização muito mais difícil, no entanto, tivemos muita gente colaborando e a equipe muito engajada e conectada com a proposta da mostra. Esses desafios provam que é possível ter o cineclube como lugar de experimentação e que efetivamente a gente possa aprender e errar.
O publico já pode esperar uma segunda edição?
Estamos ainda na pós-produção e na tarefa de não perder essa rede de comunicação e contato que tivemos ao longo do processo de construção, pensar para além da experimentação e o que estava nos debates em termos de conteúdo. O momento é concentrar forças na reflexão dessa edição.