
Por Catulo Cavalcante
Bacurau, filme do diretor pernambucano Kleber Mendonça Filho, que tem outros dois longas-metragens que agradaram muito também: Som ao redor e Aquarius. Observei uma diferença técnica muito grande entre os três, inclusive, em questões orçamentárias, mas o importante é que não perdeu o seu senso crítico e fez um filme excelente.
Bacurau traz a violência à tona, “nua e crua”, como se deve ser. Muito diferente dos longas-metragens do querido estrangeiro chamado Tarantino. Outros filmes brasileiros já mostraram como a violência deve ser retratada, no caso de Baixio das bestas, do diretor também pernambucano, Cláudio Assis. No caso do estrangeiro, maquia muito, enfeitando a violência com efeitos especiais e acaba romantizando-a. Já Bacurau, tem como tema a organização política, facção, violência contra menores e radicaliza o descaso do governo com o povo.
A construção das personagens de Bacurau é algo muito interessante, não consegui identificar um protagonismo heroico, mesmo algumas personagens se destacando, como: Lunga, Pacote, Domingas, Michael. Mas nenhum com mais destaque que outro, e daí tira-se uma analogia com a sociedade versus polícia, não temos protagonistas e sim instituição militar versus facções, que acaba matando inocentes pela forma de abordagem de nossa polícia.
Foi de deveras importância essa abordagem do assassinato de uma criança no filme, como foi também retratada, por engano. Estava com um objeto na mão e achou-se ser uma arma, isso vem acontecendo em nossa sociedade real, e geralmente, a vítima tem cor, a cor preta.
A fome, o dialeto, a falta de água e as diversas violências colocadas com muita veemência, é algo de muitos aplausos, pela cidade fictícia (Bacurau) e a real, e por ser na região do nordeste, não houve nenhum estereótipo no longa, como faz a globosat e os filmes estrangeiros, que falam do Nordeste brasileiro, até os planos com alegorias foram tomadas da nossa cultura, como no caso da máscara, nos colocando na vivência daquele povoado.
Nos planos finais, do assassinato de Michael, o diretor acertou em cheio ao matá-lo tal qual o Estado. Morrerás de fome, sede e sem luz, como o povo daquela pequena cidade. Isso é respeitar os fatos, e quem diz que o Cinema Novo morreu, aí está mais um filme que se encaixaria no movimento que foi altamente violado pela ditadura, com um roteiro que em sua maior parte se passa em cenas externas, saindo do estúdio, o que desvirtua a grande produção.
Brasil tem filme de qualidade e sabemos falar de nós, respeitar a Ancine e a Cinemateca brasileira é um dever do Estado, censura nunca mais, e o filme assume esse papel da denúncia. Viva o cinema brasileiro! Arte não é entretenimento. Se a classe média quer se entreter, precisa procurar outra fonte, e o longa prova isso. E, diferente da nossa sociedade, no filme o povo vence.